Isso não é uma crítica cinematográfica.
A história de duas pessoas que não tinham coragem de se declarar uma para a outra. E nisso passaram-se mais de dez anos. Parece que estou contando a história da sua vida? Então você precisa ler esse artigo.
Simplesmente Acontece (do inglês “Love, Rosie”) é a adaptação do livro de mesmo nome que eu não li e, portanto não posso comentar. Sei que o livro tem um formato inusitado: ele é todo escrito através de cartas, emails e sms que os personagens trocaram ao longo da vida toda.
A história resumida é a seguinte: Rosie e Alex são vizinhos e melhores amigos desde a infância. Quando chegam à adolescência, rola um clima entre eles e quando Alex vai beijar Rosie, ela passa mal. No dia seguinte ela não se lembra de nada e Alex interpreta aquilo como um “não” da parte da amiga. A partir desse momento, Alex, relutante, começa a ficar com outra menina o que causa um claro ciúme em Rosie, que não diz nada (e não é ciúme de amiga possessiva).
Rosie resolve também “seguir em frente” e vai ao baile com outro cara com quem ela vai acabar tendo uma única e desanimada relação sexual, vai engravidar isso mudará sua vida para sempre. Alex vai para os EUA (a história se passa no Reino Unido) fazer faculdade e Rosie fica na cidade natal criando a filha sozinha. No final (uns TREZE anos depois) depois de bater muita cabeça na parede, Rosie inaugura um hotel e Alex aparece “inesperadamente”. Eles se declaram um para o outro e ficam juntos.
Considerando que no primeiro “flerte” dos dois eles tinham 17 anos, aos 30 anos (ou um pouco mais) eles ficam definitivamente (?) juntos. O que é uma ótima idade para se casar e fazer planos de ser feliz para sempre. Ok. Pode-se dizer que eles não tiveram a vida desperdiçada porque ficaram com medo de falar um para o outro como se sentiam.
Aos 30 anos eles ainda vão poder namorar, casar, ter filhos, fazer planos e envelhecerem juntos bem lentamente. Mas mesmo assim Simplesmente Acontece é uma pequena amostra de uma coisa que acontece muito na vida real: as pessoas querem dizer alguma coisa para alguém e ficam com medo.
Entendo o Alex de 17 anos que não tinha coragem de dizer para Rosie que queria ficar com ela. Mas para mim já é mais difícil perdoar o Alex que, aos vinte e muitos anos, escreve uma carta e envia para a casa onde Rosie vivia com o marido e pai de sua filha.
A chance dessa carta cair em mãos erradas era de 66%. E foi o que aconteceu. Enviar um email não seria mais seguro? Ou melhor ainda: que tal falar ao vivo para ela?
Alex e Rosie têm tanto pavor de expor os próprios sentimentos que Rosie permite que Alex fique noivo e case, sem falar nada com ele (e o pior: foi ela quem deu o endereço de Alex para a ex-namorada dele e atual top-model-capa-de-revista. E ainda ficou “chocada” quando Alex e ela ficaram noivos!). Mas Alex não é melhor que Rosie. Não bastasse o episódio da carta de declaração, ele ainda aceitou casar e ter filho com mulheres de quem ele nem gostava (foram duas).
Mesmo que Rosie não soubesse de seus reais sentimentos, ele próprio sabia. E ainda assim achou que fazia sentido ter um filho com uma mulher com quem – em 30 segundos de cena – vemos que não tem nada em comum com ele (o filho foi acidental e depois ele descobriu que o bebê era do amante da sua namorada. Mesmo depois desse baque da vida ele não achou seria um bom momento para ir atrás do seu “verdadeiro” amor).
Alex e Rosie são só personagens. Porém, vivem situações muito reais. E assim como as pessoas da vida real, eles colocam a culpa nas “circunstâncias”, na “vida”, nos estranhos caminhos do destino. Os estranhos caminhos do destino não são estradas com entradas obrigatórias e proibições de fazer retorno. Eles são estradas abertas onde cada dirige da maneira que quiser.
Assim como para esses dois personagens, na vida real, dizer como realmente se sente, é algo aterrador. Mas ao mesmo tempo libertador. Imagine se Rosie, ao saber que Alex ficou noivo, ligasse para ele e contasse que o amava? Talvez ele respondesse que sentia muito, mas estava loucamente apaixonado pela noiva.
Esse é a parte aterradora. Pronto, acabou. A partir de agora Rosie estaria livre para seguir com a sua vida (depois de uma boa dose de dor de cotovelo).
Temos que parar de ter medo de expor nossos sentimentos e não ficarmos sentados sofrendo, esperando que o destino nos devolva o amor de nossas vidas no dia da inauguração do nosso próprio hotel. Certos milagres aos 45 do segundo tempo pertencem somente à Hollywood. Na vida real é preciso correr atrás do que se quer.